Há cerca de 40 anos, a Psiconeuroimunologia (PNI), área que busca compreender as relações entre os fatores psicossociais, aspectos imunológicos e saúde, ainda era considerada pouco expressiva.
Contudo, com o surgimento de estudos que buscam comprovar a relação entre cérebro e sistema imunológico, essa ciência ganha cada vez mais força, se tornando um campo interdisciplinar, unindo psicologia, neurociência, biologia, sociologia, entre outras disciplinas.
Essa ciência estuda como o estresse da vida cotidiana, principalmente nas situações mais exaustivas, tensas e crônicas, pode afetar uma série de respostas imunológicas, ocasionando alterações biológicas com severas implicações na saúde global da pessoa.
O surgimento da Psiconeuroimunologia
O pai da PNI é Robert Ader, psicólogo de profissão, o qual, quando estava condicionando ratos, acabou, por acaso, se deparando com a relação entre a comunicação entre cérebro e sistema imunológico.
Ele trabalhou em conjunto com o imunologista Nicholas Cohen, formando uma equipe perfeita para estudar a descoberta.
Ader realizava experimentos clássicos como os de Pavlov com cães, em que a salivação deles era condicionada por um estímulo auditivo. Desse modo, ao ouvirem um som específico, os cães salivavam, mesmo sem a presença de alimentos.
A versão de Ader do experimento contava com ratos, que eram alimentados com uma solução sacarina juntamente com a injeção de Cytoxan, droga que suprime o sistema imunológico e provoca desconforto gastrointestinal. Ader fez os ratos evitarem beber a solução no condicionamento.
Depois, ele parou de injetar Cytoxan nos ratos, mas continuou apresentando a água misturada com a sacarina, e, surpreendentemente, alguns ratos morreram, estando a resposta de evitação e o nível de mortalidade relacionados com a quantidade de solução de água sacarina recebida.
Desse modo, Ader viu que não somente a resposta de evitação tinha sido condicionada, como também, de forma totalmente inesperada, a queda da imunidade. Ele próprio admitiu que “ por não saber que não haviam conexões entre cérebro e sistema imunológico em teoria, eu pude considerar essa possibilidade”. Então, mesmo sendo algo teoricamente impossível na época, Ader viu que um sinal neural, o sabor, conseguiu desencadear uma redução condicionada no sistema imunológico.
Em 1975, ele publicou um estudo embasando o seu palpite sobre o ocorrido, que era replicável por outros cientistas, apesar de eles ainda zombarem de Ader. E foi assim que, de repente, descobriu-se que havia uma ligação entre o sistema nervoso central e o sistema imunológico.
Exemplos da Psiconeuroimunologia
O sistema linfático é o sistema de mensagens do sistema imunológico. Ele não está presente no sistema nervoso central, portanto, as ligações entre os dois eram consideradas impossíveis.
Entretanto, como já falamos, ligações intrigantes entre a neurociência e o sistema imunológico estão sendo descobertas, como também situações que comprovam essa ligação.
Em vista disso, há vários mecanismos interessantes quando relacionamos o cérebro e o sistema imunológico. Veja a seguir alguns exemplos:
Traumas na infância
Com a descoberta da relação bidirecional entre o sistema imunológico e o cérebro, tornou-se possível considerar que o desenvolvimento e funcionamento do cérebro a longo prazo podem ser afetados por estressores psicossociais da infância que afetem o desenvolvimento do sistema imunológico.
Desse modo, crianças que sofreram traumas e estresse psicológico durante a infância podem sofrer prejuízos no desenvolvimento cerebral, podendo, quando adultas, estar mais sujeitas a transtornos psicológicos.
Luto
Quem sabe você já ouviu uma história de um casal de idosos que, depois que um cônjuge morreu, o outro, em pouco tempo, morreu também. Isso é mais do que uma lenda urbana, porque um “coração partido” pode sim provocar a morte de uma pessoa, pois o sistema imunológico de uma pessoa enlutada pode enfraquecer, exatamente por causa das relações na psiconeuroimunologia.
Intestino
Já é bem estabelecido no meio científico a associação entre o estresse e distúrbios gastrointestinais funcionais, doença inflamatória intestinal e síndrome do intestino irritável. Você mesmo deve conhecer uma pessoa que vive uma vida estressante que possui corriqueiros problemas estomacais.
Câncer
Eventos estressantes da vida e câncer também possuem certo grau de correlação. Além disso, como comprovam profissionais da saúde que trabalham com pessoas com câncer, a perspectiva de vida dos pacientes tem um alto impacto sobre o desenvolvimento da doença.
HIV (vírus da imunodeficiência humana)
Alguns estudos encontraram evidências de que níveis altos de estresse juntamente com um apoio social diminuído pode acelerar a progressão do HIV.
Queixas de pele
Pessoas estressadas estão mais sujeitas a doenças de pele. Mesmo um dia estressante no trabalho pode fazer com que você fique se coçando em casa.
Cicatrização de feridas
Pode parecer inacreditável, mas pacientes com níveis altos de depressão e ansiedade tiveram um atraso significativo na cura de feridas. Medo e angústia antes da cirurgia estão associados a resultados piores, mais tempo no hospital e maiores taxas de re-hospitalização e complicações pós-operatórias.
Referência:
MARQUES-DEAK, Andrea; STERNBERG, Esther. Psiconeuroimunologia: a relação entre o sistema nervoso central e o sistema imunológico. Rev. Bras. Psiquiatr. , São Paulo, v. 26, n. 3, pág. 143-144, setembro de 2004. Disponível em http://dx.doi.org/10.1590/S1516-44462004000300002.