Numa sala de aula tradicional se viam crianças sentadas enfileiradas, ouvindo o professor falar, quase sem poder questionar o que estava sendo dito. As atividades eram planejadas para atender às necessidades do grupo. Todos eram expostos ao mesmo conteúdo, da mesma maneira, utilizando-se dos mesmos recursos. As escolas eram planejadas para atender uma sociedade que vivia em um ambiente de conhecimento mais estável do que hoje. Os tempos mudaram, mas como está o ensino? Será que já temos escolas adaptadas para as necessidades de cada aluno e considerando cada perfil como aprendiz?
Quais os desafios da sala de aula hoje?
A sala de aula hoje reflete o mundo em que vivemos. Lá se encontra uma grande diversidade cultural, comportamentos e hábitos diferentes. Hoje temos lado a lado, uma criança com muitas habilidades e facilidades no processo ensino-aprendizagem e outra que pode apresentar muitas dificuldades. Como um outro desafio temos o usa da tecnologia. As crianças aprendem muito com seus smartphones e computadores. Será que todas as escolas já incorporaram a tecnologia no dia a dia da sala de aula? Nas escolas de hoje encontramos crianças com histórias e experiências de vida particulares. O que todas elas têm em comum é o direito de aprender com professores com olhar individual e engajados em ensinar.
Qual é o papel do educador e das instituições de ensino no mundo atual?
O educador deve levar em conta as diferenças e trabalhar de maneira criativa e eficaz. Apresentar as mesmas estratégias e recursos para todas as crianças são práticas ultrapassadas, que consideram que todas as crianças aprendem e pensam de forma semelhante. Não se pode subestimar aquelas crianças que estão prontas para novos desafios e ao mesmo tempo ir além com aquelas que ainda não estão prontas. Os professores e as instituições de ensino estão padronizando seus alunos e desconsiderando suas habilidades e potenciais. Os alunos em uma sala de aula têm necessidades que podem ser comuns e ao mesmo tempo individuais. Uma boa educação deve atender todas essas necessidades.
O que é diferenciação pedagógica?
Entende-se por diferenciação pedagógica o conjunto de medidas didáticas que visam adaptar o processo de ensino aprendizagem às diferenças importantes inter e intra individuais dos alunos, a fim de permitir a cada aluno atinja o seu máximo na realização dos objetivos didáticos (De Corte, 1990). Segundo a autora Carol Ann Tomlinson, especialista em pedagogia diferenciada: a diferenciação pedagógica é acomodar as diferentes maneiras que os alunos aprendem e envolve uma dose de senso comum, bem como apoio na teoria e pesquisa da educação. É uma abordagem do ensino que defende o planejamento ativo para as diferenças dos alunos nas salas de aula (Tomlinson & Allan, 2000).
Para que todos tenham a oportunidade de aprender é preciso adequar o ensino para os alunos como indivíduos e não como um grupo. A diferenciação é uma modificação de rotinas de ensino e aprendizagem e podem abordar uma ampla gama de níveis de prontidão dos alunos, interesses e modos de aprendizagem (Tomlinson 2001)
Porque a diferenciação pedagógica é importante nas escolas?
A aprendizagem é um processo contínuo em que cada indivíduo tem seu ritmo e maneira individual de aprender. Segundo Piaget, cada indivíduo aprende de uma maneira diferente. Eles podem vivenciar a mesma situação no mesmo momento, mas cada uma irá aprender à sua maneira, em ritmo diferente uns dos outros. Segundo Vygotsky, as crianças devem ser estimuladas através de uma sequência de objetivos que aumentam progressivamente seu grau de dificuldade. Uma criança que não é desafiada, não desenvolverá todo o potencial de seu pensamento ou o atingirá com grande atraso.
O desenvolvimento cognitivo do ser humano está relacionado a fatores sociais, biológicos, psicológicos e afetivos. Portanto, considerando que cada indivíduo tem experiências de vida diferentes, não é possível que a aprendizagem ocorra da mesma maneira para todos. Por isso, dentro de uma sala de aula, por mais que o professor queira atingir a todos da mesma maneira, ele não obterá sucesso se não houver diferenciação. Além de cada um ter sua própria percepção e assimilação do conteúdo, cada um tem seu tempo de aprendizagem.
Quando uma classe inteira avança sem nenhuma diferenciação, alguns alunos estão condenados a falhar. Em contrapartida, existem alunos que dominam algumas habilidades antes mesmo de começar o ano letivo. Para esses, novos desafios são essenciais para que eles atinjam o seu potencial. Devido a essa heterogeneidade, a instrução diferenciada é imprescindível para a eficácia do processo de ensino-aprendizagem.
Como a diferenciação pode ser feita na prática?
O papel do professor é de suma importância nesse processo. Ele deve ser criativo ao diferenciar os conceitos ensinados. O professor deve dar aos seus alunos a chance de escolha, flexibilidade e avaliação contínua. Ele deve entender como os alunos processam e desenvolvem a aquisição e compreensão de conceitos e habilidades. Sendo um facilitador do conhecimento, ele deve entender as necessidades individuais e responder ativamente e positivamente a essa necessidade. Desta forma, os alunos são tratados como indivíduos e suas necessidades particulares de aprendizagem podem ser atendidas.
Para que isso aconteça, é necessária uma flexibilidade por parte de todo corpo docente, onde se considera o quê (conteúdo) o aluno deverá aprender, como (processo) ele irá aprender e como ele demonstrará (resultado) o conteúdo aprendido. Desta forma é possível que aluno desenvolva seu potencial máximo e tenha sucesso no processo de ensino-aprendizagem.
Qual a importância de criar um ambiente saudável para a aprendizagem?
Existem inúmeros estudos que comprovam a correlação entre o desenvolvimento de habilidades sociais e alto desempenho acadêmico. Ao entender a motivação por trás do comportamento do aluno, o clima da sala de aula pode melhorar, e em vez de gerenciar a sala de aula, o professor pode passar mais tempo encorajando os alunos a buscarem níveis mais elevados de conhecimento e motivação.
Qualquer ser humano se beneficia de um ambiente favorável ao seu aprendizado. Quando uma criança é exposta a um ambiente de constante frustração, medo e insegurança, a aprendizagem não ocorre de forma consistente. Com o medo, liberamos excesso de cortisol, o hormônio do estresse e podemos correr o risco de perder células cerebrais no hipocampo, que é a área da memória. Um ambiente favorável para a aprendizado, baseada em respeito mútuo, conexão e encorajamento gera prazer, instiga a curiosidade e a vontade de aprender. Um ambiente frio, hostil e cheio de medo gera distanciamento e falhas na aprendizagem. Segundo Madalena Freire, todos aprendem através do amor ou do ódio, nunca através da indiferença. Assim, para obtermos um bom desempenho cognitivo, é preciso que haja interação de afetividade positiva, confiança, autoestima e entusiasmo com o processo de ensino-aprendizagem.
Quando os alunos têm um bom autoconceito sobre a sua capacidade de aprendizado, não temem o fracasso e estão dispostos a realizar novos e maiores desafios. E é isso que uma sala de aula diferenciada deve proporcionar.
Quais são os desafios dos pais e educadores?
O grande desafio dos pais e educadores é descobrir maneiras de continuarmos ensinando e aprendendo em um mundo de constante mudanças. A aprendizagem só é possível através do envolvimento, da relevância e do interesse da criança. Se percebermos que elas estão expostas à essas oportunidades, tanto na escola quanto em casa, podemos acreditar que estamos no caminho certo.
Bibliografia
Jane Nelsen, Lynn Lott e H. Stephen Glenn. Disciplina Positiva em Sala de Aula, 4ª. Ed. Ed Manole, 2017.
ALLAN, S. D., & Tomlinson, C. A.; Leadership for differentiating schools and classrooms. Alexandria, VA: ASCD. 2000.
HEACOX, Diane; Differentiating Instruction in the Regular Classroom. 2012. St. Paul: Free Spirit Publishing, 2012.
HUEBNER, Tracy A.; What Research Says About Differentiated Learning. 2010, San Francisco, 2010.