Quando se fala em Disciplina Positiva muita gente imagina que a criação de filhos e de alunos saudáveis deve ser baseada em reforços positivos e em elogios para ajudar a aumentar a autoestima dos filhos. Mas será que é só isso que ajuda as crianças a desenvolverem um bom autoconceito e aprenderem a se comportar melhor? Elogio é bom, mas deve ser usado com cautela.
O elogio, segundo a Dra Jane Nelsen, criadora a Disciplina Positiva é uma forma potente de inspirar as crianças. O problema é que uma educação baseada apenas em elogios pode criar crianças viciadas em aprovação. “Essas crianças, que mais tarde serão adultos, podem desenvolver conceitos pessoais que são totalmente dependentes da opinião dos outros”, diz ela.
Embora os elogios funcionem em curto prazo, precisamos entender os efeitos ao longo do tempo.
Estudos sobre o comportamento humano indicam que existe uma grande diferença entre elogiar a pessoa e elogiar a performance, ou seja, encorajar o processo que a pessoa está envolvida.
Segundo a Disciplina Positiva, as diferenças entre elogio e encorajamento podem ser difíceis de compreender, pois são sutis e requerem parar e pensar antes de fazer afirmações precipitadas sobre a criança.
O encorajamento inspira a coragem e estimula a criança a se esforçar, aprimorando-se constantemente: “Esse resultado reflete o seu esforço!”. O encorajamento reconhece o autor da ação e o responsabiliza pelo resultado: “Eu percebi que você fez um excelente trabalho”; enquanto o elogio simplesmente glorifica e expressa a aprovação, roubando o foco para a realização e passando a ideia que estamos buscando a perfeição: “Parabéns, o seu trabalho ficou excelente”!
Pomerantz EM et al (2013) examinaram se o elogio diário das mães frente ao sucesso das crianças na escola tinha efeitos nas crenças sobre inteligência e motivava as crianças. Foram estudadas 120 crianças (média de idade = 10,23 anos) e suas mães durante 6 meses. As mães completaram uma entrevista diária durante 10 dias onde se pesquisou o quanto elas usavam elogios relacionados diretamente aos filhos (por exemplo, “Você é inteligente”) ou encorajamentos relacionados ao processo (por exemplo, “Você se esforçou”).
Os resultados apontaram que o elogio da mãe favorece as crenças de inteligência das crianças, entretanto quando estas recebem muitos elogios, tendem a evitar desafios maiores, além do funcionamento que estavam acostumadas. Por outro lado, quando as mães usaram o encorajamento, focando no processo, as crianças tenderam a aceitar desafios maiores e mostram-se motivadas a se esforçarem para superar algo que ainda não tinham domínio.
Há algumas perguntas-chaves para os pais e professores que podem ser úteis de forma a alerta-los quando estão fazendo elogios ou encorajamentos.
Por exemplo, vale pensar se ao fazer algum comentário para o seu filho ou para um aluno, se os adultos estão focando nas realizações externas, naquilo que a criança conseguiu: “Você tirou uma ótima nota nesta prova!” ou se estão apontando para algo interno da criança, convidando ela a mudar por si mesma: “Percebi como você estudou desta vez e como o seu resultado reflete o seu empenho!”.
O foco de controle no elogio é externo: “Estamos todos orgulhosos de você!”, “Parabéns, você fez o que eu esperava”, enquanto no encorajamento poderíamos dizer: “Você deve estar muito orgulhoso de si mesmo”, “Você decide o que é melhor para você”.
Mas vale lembrar que não devemos ficar preocupados se por acaso um elogio sair despercebido. Ele funciona como um doce gostoso que podemos saborear eventualmente. O problema está em usa-lo de forma recorrente. O encorajamento deve ser o alimento essencial que oferecemos as crianças em vários ambientes, pois ele propicia que as crianças percebam o quanto são capazes, estimulando o autoconceito positivo e a autoestima saudável.
Em geral quem recebe elogios se sente querido e amado por um grande feito, enquanto quem recebe encorajamento se sente cheio de poder interno para continuar a construir a sua identidade e melhorar a cada dia. Além disso, o elogio só cabe a quem está tendo sucesso na tarefa, porém o encorajamento pode ser usado tanto quando alguém obteve êxito, quanto para quem não conseguiu chegar lá ainda.
Quando ampliamos a visão do encorajamento para a sociedade, podemos entender que todos queremos ser aceitos e contribuir a um grupo. Segundo Adler, a essência do ser humano é essa: ter o senso de pertencimento e significância. As pessoas precisam sentir que pertencem à comunidade e que podem ajudar. É necessário trabalhamos de forma a reconhecer e apreciar a participação de cada um na comunidade através do encorajamento.
Pensando nos tratamentos psicológicos, a essência da psicoterapia é conseguir encorajar o paciente a mudar sua maneira de agir e pensar. O encorajamento é uma parte importante da psicoterapia e do aconselhamento de Adler. A Dra Eva Dreikurs Ferguson aponta que se a comunidade é autocrática e não dá apoio, isso leva a problemas de saúde mental nos indivíduos. Ela acredita que a cooperação e a democracia são a melhor maneira de manter os indivíduos e a comunidade saudáveis.
Assim, elogios podem ser úteis no dia a dia, mas o encorajamento é a verdadeira nutrição interna para as crianças e pode promover os melhores resultados em termos de auto estima e prevenção de problemas de saúde mental.
Palavras de encorajamento por Lynn Lott disponível para download.
Bibliografia:
Jane Nelsen. Disciplina Positiva 2015 | Editora: Manole.
Pomerantz EM, Kempner SG. Mothers’ daily person and process praise: implications for children’s theory of intelligence and motivation. Dev Psychol. 2013 Nov;49(11):2040-6.
Jennifer Henderlong Corpus & Mark R. Lepper (2007) The Effects of Person Versus Performance Praise on Children’s Motivation: Gender and age as moderating factors, Educational Psychology, 27:4, 487-508.
https://www.adlerpedia.org/
https://lynnlottec.com/about-lynn/