Como lidar com as ameaças ocultas da ansiedade relacionadas às mudanças climáticas. Maria Alice Fontes

Nos últimos anos, assuntos relacionados às mudanças climáticas têm se tornado uma preocupação crescente para muitas pessoas ao redor do mundo. A tragédia recente no Rio Grande do Sul, onde fortes chuvas e enchentes causaram grandes perdas materiais e emocionais, é um exemplo claro de como eventos climáticos extremos podem afetar nossa saúde mental.

De acordo com um estudo da Imperial College London de 2021, há cada vez mais sinais e evidências de que a mudança climática tem um impacto significativo sobre a saúde mental. Há pesquisas que apontam que temperaturas crescentes levam ao uso de uma linguagem mais próxima da depressão e a maiores taxas de suicídio. Além disso, incêndios e ondas de calor têm sido ligados a casos de depressão e transtorno de estresse pós-traumático.

Dados de uma pesquisa publicada na Lancet Planet em 2021, apontou que 59% dos adolescentes estavam muito ou extremamente preocupados com a mudança climática e mais de 45% apresentavam prejuízo no funcionamento cotidiano (por exemplo, afetando a capacidade de estudar e/ou socializar) devido à ansiedade climática. Resultados semelhantes foram observados em adultos e em várias partes do mundo.

De acordo com os autores, “a ansiedade climática aumentará conforme as pessoas forem presenciando cada vez mais eventos adversos do clima”. Então qual seria a melhor forma de lidar com as questões ambientais, sem descuidar da saúde física e mental?

O que é Ansiedade Climática?

A eco-ansiedade é definida como um medo crônico da destruição ambiental, caracterizada por preocupações sobre a inadequação das ações climáticas e os efeitos adversos da crise do aquecimento. Outros termos usados por pesquisadores de forma semelhante são ansiedade climática, preocupação com a mudança climática, angústia ambiental, estresse ecológico e luto ecológico. Pessoas que sofrem desse tipo de ansiedade podem se sentir impotentes, com medo do futuro e preocupadas com a segurança de suas comunidades e do planeta.

Porém, vale ressaltar que a ansiedade climática não é um diagnóstico médico formal. No entanto, ela é amplamente reconhecida como um fenômeno psicológico legítimo e emergente, que pode ter impactos significativos na saúde mental e no bem-estar das pessoas.

Reconhecer a ansiedade climática é crucial porque valida as experiências emocionais das pessoas preocupadas com o clima e promove a busca por apoio e estratégias de enfrentamento. É uma forma de legitimar as preocupações ambientais e encorajar a ação coletiva e individual em resposta à crise climática.

Quais as implicações da Ansiedade Climática para a Saúde Mental?

Esse estado de alerta contínuo pode levar a sentimentos de desespero e depressão, especialmente quando as pessoas percebem as mudanças climáticas como uma ameaça insuperável. A insônia e outras perturbações no sono são comuns, à medida que pensamentos intrusivos sobre o futuro do planeta dificultam o descanso. Além disso, a sensação de impotência diante da magnitude do problema pode gerar frustração e um sentimento persistente de desamparo, agravando ainda mais o sofrimento emocional.

As implicações sociais também são significativas. Indivíduos que sofrem de ansiedade climática podem experimentar isolamento social, pois se sentem desconectados ou incompreendidos por aqueles que não compartilham a mesma preocupação intensa com o meio ambiente. Isso pode levar a uma diminuição na interação social e no apoio comunitário, elementos essenciais para a saúde mental. 

Além disso, a preocupação constante pode interferir na concentração e produtividade, afetando o desempenho no trabalho ou nos estudos. Fisicamente, a ansiedade crônica pode se manifestar através de sintomas como dores de cabeça, tensão muscular e problemas digestivos, criando um ciclo de sofrimento que afeta tanto a mente quanto o corpo.

Sinais da Ansiedade Climática

  • Preocupação excessiva com o futuro do planeta
  • Pensamentos constantes sobre os efeitos negativos das mudanças climáticas.
  • Medo persistente de desastres naturais e suas consequências
  • Sentimentos de impotência e desamparo
  • Dificuldade em se concentrar em atividades diárias ou em socializar
  • Alterações no sono, como insônia ou pesadelos
  • Ansiedade em relação ao impacto das mudanças climáticas nas próximas gerações.
  • Preocupações sobre trazer filhos ao mundo devido à incerteza ambiental.

Quais os problemas para a comunidade? 

Coesão Social e Conflitos

Desastres naturais podem destruir a infraestrutura comunitária e desestabilizar redes sociais, levando a um aumento de conflitos e redução da coesão social.

Deslocamento e Migração

Deslocamentos forçados devido a condições climáticas extremas podem levar a problemas de saúde mental relacionados ao estresse de adaptação e perda de identidade cultural.

Como lidar com a Ansiedade Climática?

A ansiedade climática é uma resposta natural às preocupações com o futuro do nosso planeta, especialmente após eventos devastadores como a tragédia no Rio Grande do Sul. Diante das circunstâncias atuais, a crise ambiental se torna quase impossível de ignorar. 

Essa condição pode levar a sentimentos de desespero, impotência, insônia e até isolamento social, prejudicando o bem-estar emocional e físico. Para se proteger dessa ansiedade, é essencial adotar várias estratégias que incluem educação e conscientização sobre as mudanças climáticas, engajamento em ativismo ambiental, e conexão com a natureza.

Buscar suporte social e participar de grupos de apoio pode ajudar a sentir-se menos isolado, enquanto práticas de autocuidado, como meditação e exercícios físicos, podem reduzir os níveis de estresse. Consultar um profissional de saúde mental também é uma abordagem eficaz para desenvolver estratégias personalizadas de enfrentamento.

Ao implementar essas medidas, é possível equilibrar a consciência dos problemas ambientais com a manutenção da saúde mental, transformando a ansiedade em ações positivas e produtivas para o meio ambiente.

E por fim, deixo uma reflexão. As tragédias climáticas têm motivado muitas pessoas a agir, pensar de maneira inovadora e se envolver ativamente em soluções. Participar de iniciativas de sustentabilidade e projetos ambientais pode dar um senso de propósito e controle. Talvez, essa seja a sua oportunidade de fazer a diferença também. 

Tomar atitudes que vão de encontro com o que você acredita para o mundo é uma forma de se sentir menos impotente diante das ações sobre as quais não há como ter controle.

Ao perceber que a ansiedade pode ter uma motivação pelo uso excessivo de redes sociais e de consumo de conteúdo na internet e TV (tornando-se um gatilho), um caminho é controlar o tempo que se passa “online” e o tipo de conteúdo que é consumido.

Estabeleça limites diários para o uso de dispositivos e escolha conteúdos que promovam bem-estar e aprendizado. Praticar atividades offline, como exercícios físicos, leitura de livros e interação social, também ajuda a reduzir os níveis de ansiedade e a melhorar a qualidade de vida.

Lembre-se de que cada pessoa é única, e o que funciona para um indivíduo pode não ser o mesmo para outro. Então, experimente diferentes estratégias e encontre o equilíbrio que melhor se adapta às suas necessidades.

Colaboração: Mônica Merlini

Fontes:

Hickman C., Marks E., Pihkala P., Clayton S., Lewandowski R. E., Mayall E. E., et al.. (2021). Climate anxiety in children and young people and their beliefs about government responses to climate change: a global survey. Lancet Planet. Health 5, e863–e873.

https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/25541600/

Berry, H. L., Bowen, K., & Kjellstrom, T. (2010). Climate change and mental health: A causal pathways framework. International Journal of Public Health, 55(2), 123-132.

Clayton, S., Manning, C. M., Krygsman, K., & Speiser, M. (2017). Mental health and our changing climate: Impacts, implications, and guidance. American Psychological Association, and ecoAmerica.

Cunsolo, A., & Ellis, N. R. (2018). Ecological grief as a mental health response to climate change-related loss. Nature Climate Change, 8(4), 275-281.